sexta-feira, 29 de junho de 2012

9ª Volta do Lago Caixa – Brasília 2012



Superando Desafios!
           
             
             A Volta do Lago Caixa de Brasília é uma ultramaratona. Com pouco envolvimento da organização e staffs, pois todo o suporte fica a cargo das equipes, são 100 km percorridos sobre um percurso variado, inseguro, sem demarcação por cones, ora fácil, ora tremendamente difícil, mas, mesmo assim, a Revista Contra Relógio (CR), a elegeu como uma das 20 provas imperdíveis no Brasil. Qual é o segredo dessa prova? Fomos lá conferir.
            Desde que vimos essa matéria na CR, começamos a alimentar o nosso desejo de participar dessa prova. Todavia, sempre que levávamos essa idéia para o nosso grupo, havia uma motivação inicial, mas que nunca prosperava. Afinal, se trata de uma prova que impõe uma série de desafios logísticos, especialmente para quem mora em outra cidade.
            Já corremos maratonas, várias provas de 5, 10 e 21 km, mas, essa é uma ultramaratona. Seria hora de experimentar algo diferente? Abrir-nos para uma nova concepção de prova? Para assumir um desafio dessa magnitude é necessário confiar bastante em nós mesmos. Mais do que isso, confiar nos companheiros.
            Nessa prova correr é apenas um detalhe de um intrincado planejamento. A primeira decisão é montar uma equipe. Como ainda não estamos preparados para participar na modalidade solo e, nem em duplas, começamos a pensar em envolver um trio, um quarteto, sexteto ou até mesmo, um octeto. Entretanto, quanto maior o número de atletas envolvidos, maiores seriam as dificuldades logísticas. Assim, a grande barreira mesmo, estava em formar uma equipe para, juntos, superarmos os desafios.
            Todavia, nesse ano foi diferente. Conciliamos a nossa preparação para a Maratona do Rio de Janeiro com o nosso velho desejo de participar dessa ultra e, decidimos, na última hora, nos inscrever na modalidade de quarteto para a 9ª Volta do Lago em Brasília, realizada no último dia 17.06.2012. Para esse desafio contamos com a expertise e força dos companheiros do Grupo Giramundo Rene, Ricardo e Fernando.
            Foi a primeira vez que flertei uma ultramaratona. Algo inteiramente novo, mesmo que na forma de revezamento. Toda corrida tem a sua história e, conseqüentemente, a sua trilha sonora. Por isso, antes de prosseguir, convido-os a assistirem o vídeo abaixo. Nele está inserido o grande segredo dessa prova, além da emoção em participar dessa prova que, para nós, começou muito antes da largada.


Vídeo: 9a Volta do Lago - Brasília 2012 - " O Espírito de Equipe"

A Prova

             
            O Lago Paranoá, no coração de Brasília, foi criado durante a construção da cidade para fornecer água e ajudar a equilibrar a baixa umidade do ar nesta parte do cerrado goiano. O percurso passa por diversos cartões postais da cidade. Sete deles encontram-se na orla do lago. 

Imagem 1. Percurso da 9a Volta do Lago (100 km)

           
            Inspirada na Volta à Ilha, prova realizada em Florianópolis, a Volta do Lago, além do esforço físico, requer de seus participantes um bom planejamento e estratégia, sem os quais não se alcança a linha de chegada. A corrida é diferente das convencionais, pois os atletas, amadores ou profissionais, participam na modalidade solo (100 ou 55 km), dupla (55 km) ou em equipes de 3, 4, 6 e 8 corredores se revezando para completar um percurso difícil, com trechos cross country e muitas subidas e descidas. Isso exige grande preparo físico e psicológico.
            O tempo limite para finalizá-la é de 10 horas para equipes de 2, 3, 4, 6, 8 integrantes, de 12 horas para a categoria ultramaratona individual 100 km e 7 horas para a categoria ultramaratona individual 55 km, sendo o horário de fechamento da  chegada  às 17h30.  Sagra-se vencedora a equipe que completar o percurso no menor tempo, independentemente do número de atletas.


O Planejamento

             
            Uma prova com essa característica requer um cuidadoso planejamento para, ao menos, ser finalizada. De todos os detalhes, sem dúvida alguma, correr, é o menos importante. Como fizemos nossa inscrição no último momento, não tivemos muito tempo para planejar, mas, utilizamos cada minuto que tivemos reunidos para avaliarmos todas as alternativas disponíveis para que realizássemos uma boa prova.


Foto 1. Planejamento em Goiânia


            Inscrevemos na modalidade de quarteto, com dois atletas bem experientes. Os outros dois iniciantes. Dos quatro, três são militares. Um deles, o companheiro Ricardo, possui larga experiência em corridas, circuitos de cross country, provas de orientação e, também, neste tipo de competição. Seu suporte na organização, leitura, navegação e impressão dos mapas altimétricos foi fundamental.
            O nosso planejamento foi um ato contínuo. Procuramos ser cuidadosos desde a aquisição dos suprimentos necessários (alojamento, comida, hidratação, etc.) até a escolha de qual atleta faria determinado trecho da prova. 


Foto 2. Adquirindo Suprimentos


            Essa edição da Volta do Lago distribuiu 14 trechos a serem percorridos, com diferentes graus de dificuldade. Ora longos, ora curtos, oscilando entre descidas e subidas, ora no asfalto, ora cross-country. Para dificultar o nosso planejamento, o regulamento estabelecia que nenhum atleta poderia percorrer dois trechos consecutivos. Com base nos mapas altimétricos, procuramos dividir os trechos da forma mais equilibrada possível, para que ninguém ficasse sobrecarregado. A princípio pensamos em distribuir os trechos de forma equitativa, isto é, algo em torno de 25 km. Por sorte, a partir de nossa experiência em provas passadas, já tínhamos uma idéia de quais seriam nossos principais desafios.
            Conseguimos sair de Goiânia com um planejamento, onde cada atleta já sabia quais seriam os seus objetivos individuais. Entretanto, em Brasília, continuamos a planejar e voltamos a discutir novas possibilidades de transições nos Postos de Integração (PI). Nessa hora, o grau de maturidade da equipe foi fundamental, pois conseguimos redefinir os trechos de forma a deixá-los mais equilibrados em termos de quilometragem, grau de dificuldade e alinhados com as principais potencialidades e características individuais de cada atleta.


Foto 3. Planejamento em Brasília

            
              Abaixo se encontra a distribuição dos trechos para cada atleta. Hoje não temos a menor dúvida de que eles ficaram muito bem distribuídos e, conseqüentemente, nas mãos do atleta certo.    Por exemplo, todos enfrentaram dificuldades, mas, para nós, o trecho que mais chamava a atenção pelo grau de dificuldade seria o trecho 9, conhecido como o “trecho da barragem”. Para muitos, o mais difícil de todos, com terreno muito variado, sendo ora asfalto, ora cross-country, com subida e descida forte, exigindo muita atenção do atleta.
            Qualquer um de nós teria condições de cumprir essa fase, entretanto, não havia em nosso grupo, nenhum atleta melhor preparado para executar essa atividade do que o colega Ricardo. Ele a cumpriu muito bem, chegando ao PI com um tempo muito menor daquele que havíamos previsto, com um pace de 4min30seg/km. Experiência? Velocidade? Resistência? O que é mais importante nessa hora? O Ricardo conseguiu equilibrar bem essas três características e, ainda teve sorte durante essa fase, considerada, por nós, a mais crítica da corrida. Essa foi uma decisão típica que tivemos de tomar e, nessa hora, o grau de maturidade do grupo foi fundamental.
            Vejam abaixo como os trechos foram distribuídos e os respectivos tempos para realizá-los:

Trecho 1 – 9,4 km
Atleta: Nilo
Largada: Eixão Sul – altura do Cine Centro são Francisco – entre quadras 102/103 sul
Chegada: Concha Acústica
Características: Asfalto quase todo em descida
Tempo no Trecho: 36:49:1 (3:55 / Km)
Trecho 2 – 7,0 km
Atleta: Fernando
Largada: Concha Acústica
Chegada: Estacionamento externo do Centro Olímpico da UnB.
Características: Asfalto com trechos planos e ondulados
Tempo no Trecho: 30:19:2 (4:19 / km)
Trecho 3 – 4,7 km
Atleta: Rene
Largada: Centro Olímpico UnB
Chegada: Calçadão beira lago Asa Norte
Característica: Percurso todo em asfalto plano
Tempo no Trecho: 20:26:9 (4:21 / Km)

Trecho 4 – 5,9 km
Atleta: Ricardo
Largada: Calçadão beira lago Asa Norte
Chegada: Parque Vivencial II Lago Norte
Características: Percurso muito difícil e com terreno variado. Começo no asfalto e final cross-country.
Tempo no Trecho: 28:11:9 (4:46 / km)
Trecho 5 – 9,6 Km
Atleta: Rene
Largada: Parque Vivencial II do Lago Norte
Chegada: Clube do Congresso do Lago Norte
Característica – Saindo pela ciclovia do Parque do Lago Norte até ao lado da Academia Barra
Tempo no Trecho: 44:00:40 (4:35 / km)

Trecho 6 – 8 km
Atleta: Nilo
Largada: Clube do Congresso Lago Norte
Chegada: Estacionamento em frente ao posto policial na QI 01 (ao lado do Deck Norte).
Características: Percurso fácil e longo, poucas subidas, pista de asfalto.
Tempo no Trecho: 42:54:60 (5:21 / km) – Tempo real 36:10:00 (4:31 / km)
OBS.: Fomos penalizados pois ao chegamos o PI ainda estava fechado.

Trecho 7 – 8,4 km
Atleta: Fernando
Largada: Estacionamento ao lado do Deck Norte
Chegada: Piscinão do Lago Norte
Características: Percurso em asfalto e pouca ondulação.
Tempo no Trecho: 39:08:20 (4:39 / km)

Trecho 8 – 5 km
Atleta: Rene
Largada: Piscinão do Lago Norte
Chegada: Até a altura da entrada para a ML 10.
Características: Percurso em asfalto com subidas e descidas longas.
Tempo no Trecho: 23:16:20 (4:39 / km)

Trecho 9 – 8,9 km
Atleta: Ricardo
Largada: ML 10
Chegada: Ermida Dom Bosco
Características: Muito variado. Asfalto, cross-country, subida e descida forte. Se exigirá muita atenção.
Tempo no Trecho: 43:43:00 (4:54 / km)

Trecho 10 – 7,6 km
Atleta: Fernando
Largada: Ermida Dom Bosco
Chegada: Gramadão da Ponte JK – via Lago Sul.
Características: Muito variado. Asfalto, iniciando em subida forte, cross-country.
Tempo no Trecho: 44:29:60 (5:51 / km)
Trecho 11 – 8,0 km
Atleta: Rene
Largada: Gramadão Ponte JK/ Lago Sul
Chegada: QL 16 Lago Sul – altura do Posto Texaco
Características: Percurso em asfalto com relevo variado e subida forte.
Tempo no Trecho: 36:55:40 (4:36 / km)

Trecho 12 – 3 km
Atleta: Fernando
Largada: QL 16 Lago Sul – Estacionamento da Igreja Presbiteriana.
Chegada: Pontão do Lago Sul
Características: Percurso em asfalto com subida no início e plano no restante.
Tempo no Trecho: 16:14:00 (5:24 / km)

Trecho 13 – 8 km
Atleta: Ricardo
Largada: Pontão do Lago Sul
Chegada: Acesso Av. das Nações /L2 Sul
Características: Percurso em asfalto e relativamente plano.
Tempo no Trecho: 41:47:8 (5:13 / km)

Trecho 14 - 6,5 km
Atleta: Nilo
Largada: Acesso Av. das Nações /L2 Sul
Chegada: Eixão Sul – Área Largada/Chegada
Características: Percurso em asfalto, quase todo em subida constante.
Tempo no Trecho: 29:25:9 (4:31 / km)

            
               Vejam abaixo um resumo dos trechos e quilometragem total percorrida por cada atleta:


ATLETAS
TRECHOS
KM
NILO
1, 6 e 14
23,9
FERNANDO
2, 7, 10 e 12
26,0
RICARDO
4, 9 e 13
22,8
RENE
3, 5, 8 e 11
27,3



ORGANIZAÇÃO
             

           Chegamos a Brasília no sábado. Fomos direto retirar os nossos kits e já enfrentamos o primeiro problema. Fomos informados pela organização de que, por “falha” do fornecedor, não foram produzidas camisas no tamanho “M e G” em número suficiente para atender a todos os corredores.
            Assim, tivemos que nos contentar com modelo do tamanho “P”. Para nós, o “P” virou babylook. Infelizmente, já havíamos ouvido essa “história” de outro evento (X-Terra) promovido por esse mesmo organizador na cidade de Pirinópolis - GO. É inacreditável que uma das corridas imperdíveis do Brasil ainda passe por problemas como esse. Ainda bem que preparamos todos os nossos suprimentos e hidratação.


Foto 4. Retirando os kits em Brasília


            Ainda com relação a problemas enfrentados pelos atletas nessa corrida, vale a pena ouvir o depoimento do Jorge, ultramaratonista carioca, que participou na modalidade solo e nos relata em um vídeo publicado no seu blog algumas reclamações. Para ele, definitivamente, esta não é uma prova para ser realizada sozinho ou individualmente, pois o apoio oferecido e a segurança, é muito precária. 


            De qualquer forma, a organização se resguardou informando previamente no regulamento da prova de que “o percurso seria, predominantemente, nas avenidas que circundam o Lago Paranoá, com o trânsito livre para os carros, devendo os atletas permanecerem no sentido normal da via, sendo de sua obrigação o conhecimento prévio do trecho a ser corrido”.
            Não temos notícias de acidentes, mas, não foi uma prova bem sinalizada. Quem esperava por pessoas aplaudindo ao longo do caminho e por segurança, se decepcionou. Não havia demarcação por cones. Os atletas acabavam correndo no acostamento das vias, muitas vezes isoladamente, em função do longo percurso, entre os carros, ônibus e caminhões apressados.
            Houve também muitos atletas que se perderam dentro de alguns trechos, por falta de demarcação ou por falta de uma correta orientação. Outro ponto negativo foi que, apesar de haver vários staffs presentes, percebemos que muitos deles eram inexperientes e, quando eram indagados sobre algum aspecto da prova, não sabiam informar. Nós testemunhamos tudo isso.
            Outro ponto que influenciou negativamente o desempenho de muitas equipes foi o de que os PIs (Postos de Integração e a Chegada) tinham horário de abertura e fechamento. Como optamos por fazer a nossa largada às 6h15min fomos penalizados em dois PIs, onde tivemos que esperar alguns minutos para que fossem abertos para, então, efetuarmos a transição. Para nós ficou claro que, equipes com corredores avançados ou mais experientes, não deveriam ser os primeiros a largarem. Infelizmente, aprendemos errando.
            Foram oferecidos aos corredores três horários diferentes de largadas. Às 06h15m, às 07h e, às 08h. Optamos por fazer a primeira largada, crendo que isso nos pouparia um pouco do sofrimento gerado pelo calor ao longo do dia. Mesmo com a chuva que caiu no sábado à tarde, o calor veio forte no dia seguinte. Hoje sabemos que a escolha de largar às 6h15min não foi a mais acertada, mas, por outros motivos que descreverei a frente.


A CORRIDA
            

           No Domingo, acordamos às 04h da manhã. Às 05h30min já estávamos no local da largada. Ao chegarmos observamos que tudo estava muito quieto. Nem parecia que haveria uma corrida naquele dia. Os atletas se aqueciam no Eixão, em meio aos carros, pois ele não havia sido fechado ainda.
            Aos poucos o dia foi clareando e mais corredores foram chegando, ainda que timidamente. Tudo muito silenciosamente. Fazia um pouco de frio. Sem som, sem barulho. O check-in para a largada ocorreu silenciosamente. De barulho mesmo, só os tênis que soavam ao pisarem sobre o asfalto (num rugido seco em forma de oração).


Foto 5. Grupo unido no pódium antes do check-in e antes da largada

Foto 6. No grid de largada (6h15min da manhã)

            
           Foram mais de 1900 atletas inscritos e divididos em mais de 300 equipes, entre duplas, trios, quartetos, sextetos e octetos, mistos ou não. As equipes conduziam seus próprios veículos de apoio (cerca de 300) com comida, bebida, suplementos e tudo o mais necessário para as mais de sete horas de prova.
            Nossa equipe estava entre eles. Preparamos o nosso veículo com tudo aquilo que achamos que seria necessário. Houve muita união, comprometimento e companheirismo, o que nos fortaleceu ainda mais como grupo.
            Ninguém fez “corpo mole”, pois cada um sabia que, após finalizar o seu trecho, o próximo companheiro a fazer a transição estaria aguardando lá no Posto de Integração (PI) para fazer a troca, a partir do qual tudo começaria de novo. Assim, ora éramos corredores, ora motoristas, controladores de tempo, navegadores, fotógrafos, encarregados de hidratação etc.


Foto 7. O companheiro Ricardo no Pier L2 do Lago Norte

Foto 8. No PI - Transição entre os companheiros Fernando e Rene no "Piscinão do Lago Norte"

Foto 9. No PI - Transição entre os companheiros Rene e Fernando na QL 16 Lago Sul


            O ESPÍRITO DE EQUIPE, que tomou corpo desde quando iniciamos o nosso planejamento, foi a força que nos alegrou, nos momentos fáceis e nos motivou nos momentos mais difíceis e críticos, quando o cansaço nos rondou. Também, foi ele que nos fortaleceu, quando finalmente superamos esse grande desafio.
            Hoje entendemos o que torna esta corrida especial. Mais do que o fato de correr em Brasília, ao lado de belos cartões postais, na orla do lago, enfrentando um percurso de 100 km, o trabalho em equipe, sem dúvida alguma, é o grande segredo para o sucesso dessa prova. Por ele estaríamos dispostos a fazer tudo novamente.
            Esta é uma prova onde a jornada é mais importante do que a chegada. Apesar de todos os percalços enfrentados, tudo foi uma grande festa! O resultado de todo companheirismo e união pode ser visto na chegada, onde fizemos uma grande confraternização. 


Foto 10. Confraternização logo após o fim de nossa jornada


RELATOS PESSOAIS SOBRE A PROVA
           
             
             Abaixo segue o meu relato pessoal e, também o dos companheiros Rene e  Fernando, sobre a participação nessa prova:

Rene M. Miguel

            “Esta prova realmente nos trouxe uma experiência grandiosa. Lembro-me do dia em que conversamos sobre ela. Estávamos em um dos treinos correndo pela Av. Rio Branco no Jaó, quando decidimos que a faríamos. Isso só se confirmou na semana em que se encerravam as inscrições, quando o Nilo e o Ricardo confirmaram a participação. A partir daí começamos os preparativos: a inscrição e a busca por informações sobre a prova. Realizamos uma reunião na véspera de nossa viagem para fazer um planejamento que, no sábado, já em Brasília, foi todo refeito. Tudo foi mudado (para melhor). Um dos aspectos muito positivos desta prova é que se todos os integrantes derem a sua contribuição, em idéias e opiniões com o objetivo de fazer uma boa prova, isso realmente acontece. Lembro-me da sugestão do Nilo, quando estávamos dividindo os trechos por distância, de que deveríamos seguir as características de cada atleta. Isso foi fundamental na escolha dos percursos e conseqüentemente no resultado final que nossa equipe alcançou. Cada trecho desta prova tem uma dificuldade específica. Para alguns, a dificuldade está na velocidade a ser desenvolvida. Para outros, no terreno repleto de variações com trechos em terra, grama, mato, charco, etc. Já para outros as dificuldades são as variações em termos de subidas e descidas. Tudo isso tinha que ser levado em consideração de forma concomitante com determinado horário, pois a dificuldade é agravada pelo clima quente. Foi assim que cada atleta assumiu a sua tarefa, de acordo com a sua capacidade para enfrentar as dificuldades de seus trechos. Ao final da prova estávamos lá no pórtico de largada e chegada, esperando pelo o Nilo que foi escolhido pela equipe para fechar o último trecho. Ao o avistarmos, ainda bem longe, nos preparamos para acompanhá-lo nos últimos metros para, assim, chegarmos todos juntos, depois de um dia de muitos desafios vencidos.”

Fernando Medeiros

Trecho 2

            “O Trecho 2 foi o início da minha participação. Tínhamos 7,0 km a percorrer e, como sempre, a expectativa era grande para começar. Iniciei saindo da Concha Acústica. Os primeiros quilômetros foram tranqüilos. Trecho em asfalto com altimetria favorável, o que me permitiu aquecer melhor. Depois, ingressei pela longa descida do Clube Almirante Alexandrino, passando pela sua pista de Cooper que, por sinal, ostentava uma bela visão, de um lado o Lago e, do outro, piscinas e embarcações. Por fim, na saída, enfrentei uma respeitosa subida. Em seguida, começou o trecho cross-country. Esperava muita lama, pois havia chovido muito no dia anterior, mas, ao contrário, me deparei com um terreno de terra batida. Apesar disso, esse ponto exigiu bastante atenção, tanto pelas irregularidades do terreno quanto pelo mato, que em alguns pontos, alcançava a altura do rosto. Superado isso, retornamos ao asfalto e, poucos metros depois estava a chegada, no Centro Olímpico da UNB”.

Trecho 7

            “Diferente do primeiro, o trecho 7 foi de 8,4 km, iniciado no estacionamento ao lado do Deck Norte. Era todo em asfalto. Iniciei numa acentuada descida por cerca de 1,5km, o que me permitiu desenvolver um bom ritmo. Logo depois, uma longa subida, que cobrou bastante das pernas. No restante do trecho, encontrei pequenas as oscilações de altimetria até chegar no Piscinão do Lago Norte, onde fiz a transição com o colega Ricardo”. 

Trecho 10 

            “Este trecho, sem dúvida alguma, foi o mais difícil que enfrentei. Os 7,6 km de sua extensão trouxeram vários pontos críticos. Sai da Ermida Dom Bosco numa subida forte. Passei, em seguida, para o cross-country que trazia cascalho, buracos, descidas e subidas acentuadas, praticamente uma corrida radical. Voltando ao trecho de asfalto, segui até da Ponte JK, passando por baixo dela, onde desci um íngreme acesso que possuía apenas um corrimão de madeira. Infelizmente, nesse local faltou sinalização ou staffs indicando o caminho a seguir, o que me fez perder tempo”.

Trecho 12

            “Finalizei minha participação na Volta do Lago correndo apenas 3,0km. Trata-se de um percurso tranqüilo, rápido, com altimetria fácil e praticamente todo plano. Ele partia do estacionamento da Igreja Presbiteriana, seguindo até o Pontão do Lago Sul.“


Nilo Resende

            “Recebi uma tarefa de grande responsabilidade, pois fiquei encarregado por fazer o primeiro trecho (1), um intermediário (6) e, também, o último (14). Foram três experiências muito distintas uma da outra. É muito diferente correr 30 km continuamente e fazer estes mesmos 30 km com longos intervalos de descanso. O corpo esfria e estranha muito, tornando-se muito difícil a tarefa de recomeçar a corrida. O segredo que aprendi com o experiente companheiro Ricardo está em tentar manter o corpo aquecido e alongado. Foi o que procurei fazer.”

Trecho 1

            “Saí para cumprir o primeiro trecho antes de o sol nascer. Fazia frio naquela manhã. Por ser quase todo em descida, pude imprimir um ritmo bem rápido. Por sorte consegui fazer um bom aquecimento prévio. Fiz a transição com o companheiro Fernando abaixo do tempo previsto, “batendo em sua porta antes das 7h.” Consegui bater o meu recorde pessoal nos 9 km realizando esse trecho.

Trecho 6

            “Já no trecho 6, o intermediário, fiz a transição com o companheiro Rene, que fez uma brilhante corrida. Foi um trecho relativamente fácil, mas envolveu um percurso com longas subidas. Consegui imprimir um ritmo excelente de prova. Entretanto, isso acabou por penalizar em 10 minutos a nossa equipe, pois cheguei ao PI que ainda estava fechado. O companheiro Fernando teve que aguardar cerca de 10 min para fazer a transição.”

Trecho 14

            “O trecho 14 e, também o último foi o mais insólito de todos. Fiz a transição com o companheiro Ricardo, que pegou uma verdadeira “pedreira” no trecho 13. Feita a transição, parti para cumprir os últimos 6,5 km sobre o Eixão. Todo esse percurso foi caracterizado por uma subida constante. Não podia desanimar. Era o sprint final.
            O fato curioso desse trecho ficou por conta de que, corri todo ele praticamente sozinho, isto é, sem nenhum outro corredor por perto, o tempo todo. Lembro-me de ter passado por um ultramaratonista, um verdadeiro guerreiro e, outro corredor. Cheguei a pensar: - Ou estamos muito bem na corrida, ou, muito mal. Onde estava todo mundo?
            Particularmente, naquela tarde, por volta das 14h30min, trinta minutos antes do que havíamos previsto, o Eixão voltava a ficar silencioso. Um ou outro caminhante passou por mim e me saudou, dizendo: Força! Esta quase acabando! De fato, o que era 6,5 km para uma prova de 100?


Foto 11.  Força total no último trecho

             
           Para não decepcionar meus companheiros, que já haviam cumprido sua jornada e aguardavam no pórtico de chegada, procurei imprimir um ritmo mais forte, para fazer “aquela chegada”. Fiquei emocionado ao me aproximar dos 500 metros finais e ver todos eles se aproximarem e correrem ao meu lado para, assim, chegarmos todos juntos, abraçados. Esta, sem dúvida alguma, foi a chegada mais emocionante de minha vida como corredor.”


Foto 12. Todo o grupo junto. Uma chegada emocionante!


           
O LEGADO

           
             Desde o nosso despertar, foram praticamente 11 horas de total dedicação para essa prova. Oito horas dela passamos, ora correndo, ora oferecendo suporte para o companheiro que corria.
            Foi a primeira vez que enfrentei uma ultramaratona. Cruzei, aplaudi e procurei incentivar alguns ultramaratonistas, verdadeiros guerreiros. Foi uma grande oportunidade de vê-los em cena, correndo. Acreditem! Eles também são de carne e osso, mas possuem uma resistência tremenda. Parabéns a todos!
            Sem dúvida alguma, o ESPIRITO DE EQUIPE foi o nosso combustível, sendo ele também o grande segredo dessa prova. Ele foi o gerador de todo o nosso entusiasmo frente a este grande desafio, agora superado.
            Como tudo nessa vida, fica sempre um legado. Aprendemos muito fazendo essa prova. Por exemplo:

  • O companheirismo, a preocupação com o bem-estar do outro, a positividade e comprometimento para com o sucesso do grupo, decorrentes do verdadeiro “Espírito de Equipe” é um poderoso combustível para superar as adversidades;
  • É muito diferente correr 30 km continuamente, e fazer estes mesmos 30 km com longos intervalos de descanso. O segredo está em manter-se aquecido e alongado;
  • Procurar sempre contar com o suporte de alguém mais experiente. Nós tivemos a sorte de ter ao lado o companheiro Ricardo, cuja experiência em corridas (cross-country e orientação) e suporte na leitura das cartas altimétricas e organização foi fundamental para superarmos o desafio;
  •  Mesmo tendo esse suporte, PLANEJAR com antecedência. Pensar em todas as possibilidades e possíveis intercorrências;
  • Em uma corrida desse tipo não se consegue comer o tanto que imagina. Preparamos muito suprimentos que não chegamos a consumir.
  • Hidratação é tudo. Nunca economizar na água e nos isotônicos;
  • Não deixar de revisar o carro de apoio! Não se esquecer de abastecê-lo (claro que não passamos por isso, porque previmos antes essa possibilidade). - Mais um aprendizado proveniente da Maratona de Curitiba 2010;
  • Ser sincero. Se achar que determinado trecho é pesado para você, não o faça! Deixe que alguém mais experiente possa fazê-lo.
            Apesar de todo o cansaço proveniente de mais de 7 horas dedicados exclusivamente para essa prova, estamos muito felizes, mais preparados para enfrentar a Maratona do Rio de Janeiro e, agora, dispostos a enfrentar a 10ª edição deste grande desafio no próximo ano.
            Um grande abraço e que os ventos estejam sempre ao nosso favor!

Fonte:

Revista Contra Relógio – Ano 18 – Nr 208 – janeiro de 2011