Que
vença o melhor!
Como atividade esportiva, a
corrida é mesmo diferenciada. Além dos inúmeros benefícios proporcionados por
ela, no campo físico, psíquico ou social, ela ainda nos ensina que, quem corre,
nunca é derrotado, independente do numero de pessoas que chegarem a nossa
frente.
Apesar de ser um esporte em
que todos são vitoriosos, as competições estão por aí e, o número e a frequência
com que elas são realizadas aumentam significativamente em todo o país. Ora, se
é uma competição, é necessário haver um vencedor para ocupar o lugar mais alto
no pódio.
Se afirmamos inicialmente
que, na corrida, todos somos vencedores, seria
possível um maior numero de pessoas ocuparem esse lugar no pódio? A
resposta é SIM! Este é o racional
que se encontra por trás da premiação por faixa etária, que também funciona
como um dos mais importantes gatilhos para incentivar os atletas veteranos a
continuarem treinando.
Entretanto, temos observado
na prática, em diferentes segmentos de competições, isto é, desde as provas
tradicionais até aos grandes circuitos de corrida, que há uma tendência, cada
vez maior, de não se realizar a premiação dos atletas de acordo com suas faixas
etárias. Sem dúvida alguma, este é um assunto quente e, esta, uma excelente
oportunidade para abordar esta questão.
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Imagem 1. Atletas sendo premiados na faixa etária logo após a prova. |
Competir e cooperar faz
parte da natureza humana. O mundo que conhecemos hoje é fruto de sucessivas
combinações destes dois fatores, utilizados pelo homem em diferentes momentos
para superar e VENCER os desafios impostos pela natureza ou criados por ele
próprio e, assim, sobreviver.
Assim como na vida, em se
tratando do esporte, coletivo ou individual, VENCER é importante. Porém,
critérios como ÉTICA, INTEGRIDADE, COMPANHEIRISMO,
JUSTIÇA, entre outros, também nos ensinam que, saber competir e vencer, é mais importante ainda. Esta é a base
sobre a qual o esporte está alicerçado.
De forma geral, as
competições exercem um papel significativo ao ser responsável por fornecer a
motivação necessária para que atletas de diferentes idades continuem treinando
e mantendo um estilo de vida mais saudável, o que pode servir de inspiração
para muitos que ainda não o são.
Em diferentes modalidades
esportivas, especialmente no atletismo, incluída a corrida de rua, durante as
competições se avalia, se reconhece e premia aquele (a) ou aqueles (as) atletas,
que se destacaram por estarem em melhores condições em um dado momento.
Como em se tratando de
corrida de rua não é viável realizar provas por categorias específicas de
atletas, é comum que todos larguem juntos, independente do sexo, idade ou de
serem, ou não, portadores de alguma necessidade especial.
O critério de justiça,
inerente à pratica esportiva, deixa de ser atendido quando os atletas
participam de uma competição em condições de desigualdade. É o que acontece
quando vemos no regulamento de algumas provas que só haverá uma premiação geral.
Assim, atletas mais velhos, acima de 40 anos, acabam competindo em situações
desiguais com os mais jovens.
Mesmo nestas condições, não
é raro ver o atleta mais “velho” no pódio. Porém, na prática não é o que
acontece. Aqui, se caracteriza uma situação de desigualdade. Uma premiação
geral normalmente envolve dinheiro e troféus, cujos valores variam de acordo
com a colocação do atleta.
Felizmente, os corredores ainda
podem competir, mesmo quando envelhecem.
A classificação por faixa etária, além de incentiva-los a continuar
treinando, é uma forma de corrigir este desvio ao permitir que os atletas corram
com pessoas de sua idade.
Por isso, é lamentável
quando se vê por aí competições sendo realizadas sem atender a esse critério.
Normalmente, as premiações por faixa etária, quando contempladas pelo regulamento, são realizadas apenas com troféus. Em poucos casos há
premiações em dinheiro.
Mesmo quando determinada
competição adota o critério da faixa etária, ainda é possível observar pontos
de melhoria. É o que acontece, por exemplo, com as amplitudes de idade
comumente utilizadas.
O ideal seria que elas
adotassem uma amplitude de cinco em cinco anos (5-5 anos). Entretanto,
normalmente elas adotam o padrão de dez em dez anos (10-10 anos), o que pode
ser considerado um abismo quando o atleta se encontra na casa dos cinquenta
anos ou acima e se vê obrigado a competir com atletas mais jovens.
O fato é que à medida que
envelhecemos, perdemos um pouco de nossa capacidade como atleta. Estudos na
área de fisiologia sugerem que, se você continuar treinando, mantendo a mesma
rodagem (quilômetros percorridos) e a mesma intensidade, essa capacidade será
lentamente reduzida. A partir dos cinquenta anos, a fisiologia do corpo se
modifica drasticamente.
Mais lamentável ainda é ver
regulamentos de provas utilizando uma amplitude que coloca sob uma mesma faixa
etária, todos os atletas acima de 60 anos, o que pode ser considerado um absurdo.
Onde está o critério de justiça para com os atletas acima de 70 anos neste caso?
Melhor seria que nem houvesse a estratificação.
É importante lembrar que já temos
duas grandes categorias: masculino e feminino. Reconhecemos que atender a esse subcritério,
o da idade, é um trabalho a mais para as empresas organizadoras de eventos
dessa natureza, pois requer mais de investimento na confecção de troféus, além
de mais tempo e cuidados especiais para corrigir falhas.
Independente do
tipo de classificação, subir ao pódio, no calor das emoções é mais do que um
reconhecimento. É um ritual. Para que seja viável, é necessário que os atletas
e demais envolvidos tenham sempre paciência, pois a cerimônia de premiação é
mais demorada. Além disso, ainda é necessária uma boa dose de compreensão, ao
ter que lidar com possíveis falhas.
Para evitar estes
transtornos, algumas empresas começam a adotar a prática de realizar somente a
premiação geral imediatamente após a prova, deixando a premiação por faixa
etária, quando ela estiver prevista no regulamento, para um segundo momento,
isto é, alguns dias após a prova. Esta prática aumenta o número de transtornos para
os atletas, especialmente aqueles que residem em outras cidades.
Recentemente tivemos um
claro exemplo desta prática, com uma das mais tradicionais provas de 10 milhas
do Brasil. O evento que já estava em sua 24ª edição, reuniu gente de todo o
país. Atletas que treinaram sério e se dedicaram para aquela prova. Eles foram
surpreendidos pela organização ao ser anunciado que não haveria premiação por
faixa etária naquele dia e que os troféus seriam enviados posteriormente pelos
Correios. Uma expectativa frustrada.
Os atletas em geral não veem
esta prática com bons olhos, pois, se cria um problema a mais. Confira a
logística: ele se inscreve em um local, retira o kit da corrida em outro,
participa da competição em outro e, ainda tem que aguardar ou se deslocar novamente
para, então, receber o “merecido” troféu. É um claro sinal de que realizar uma
cerimônia de premiação para os campeões em cada faixa é muitas vezes um contragosto
para quem organiza.
A realidade nos mostra que
nos moldes como os eventos são realizados nos dias de hoje, os atletas que se
preocupam com este tipo de questão, não é a maioria. Eles podem nem dar lucro
para as empresas, além de, normalmente, serem também os que mais brigam por
seus direitos, adquiridos com muito suor.
A grande maioria é formada pelos
demais participantes. São os verdadeiros “vencedores” que saíram do
sedentarismo e agora angariam os benefícios de uma melhor qualidade de vida.
Para eles, tanto faz. São estes que dão lucro e engrossam o funil de largada. Pagam
o que é cobrado na inscrição e, não faltando água no percurso e segurança, tudo
bem.
Entretanto, independente de
seu perfil como atleta, a verdade é uma só: fazemos parte de uma tribo. Uma
tribo de corredores. O reconhecimento do esforço de acordo com a faixa etária
continuará funcionando como um gatilho motivacional para que continuemos apoiando,
nos inscrevendo e participando continuamente das competições. Com um pouco mais
de dedicação e afinco, todos, levando os treinos a sério, poderemos subir no
pódio em
algum momento.
Atletas e empresas organizadoras
de eventos dependem um do outro. É preciso haver um pouco mais de respeito e
entendimento, de ambos os lados.
Acreditamos que os recursos
atualmente disponíveis, especialmente os modernos sistemas de cronometragem e
os valores arrecadados na forma de patrocínio e inscrições, são mais do que suficientes
para se realizar competições de qualidade e permitir uma convivência harmoniosa
entre atletas e a organização destes eventos.
Desejamos a todos boas corridas!